26 janeiro 2007

Alentejo em Lisboa


Para os desinteressados, o Grupo Norte-Sul vai actuar, amanhã 27 de Janeiro de 2007 pelas 15:30 horas, na Casa do Alentejo, em Lisboa.


Uma oportunidade de visitar um palecete de interessante traça arquitectónica em pleno centro de Lisboa e ouvir estes desalmados...


A entrada é livre.

Morada: R Portas S Antão 58, Lisboa
1150-268 LISBOA

24 janeiro 2007

Cassiopeia



Uma quente brisa soprava àquela hora da noite, evaporando a água que restava no cabelo, depois do banho da meia-noite. Entre o meu corpo, deitado no saco de cama e a caprichosa Via Láctea vai uma linha recta, um estender de braço, um sopro na vela do sonho viajeiro.

Passaram mais de trinta anos. Fazíamos dos areais da Fonte-da-Telha a nossa tribuna onde se discutiam ideias, se arquitectavam sonhos e projectos, onde se interrogavam os sentidos da vida e da morte. De dia, era futebol e banhos no mar azul. Á noite convocávamos os espíritos libertários que nos acompanhariam em dissertações filosóficas. Á luz de uma fogueira tocávamos guitarras, em canções infinitas de liberdade e rebeldia de quem tem uns eternos dezoito anos.
No céu estrelado, qual marca de um Zorro invisível, o W inequívoco da Cassiopeia velava o sono breve.

Passaram mais de trinta anos. As perguntas permanecem, quase todas de respostas ignoradas. Os sonhos morreram ou estão moribundos. A Cassiopeia, se ainda lá se encontra, está cada vez mais pálida, e até as dunas da Fonte-da-Telha estão a desaparecer...

Isabel Correia, assim não vale...





Tenho um Amigo que faz anos hoje.

Um amigo com A (grande) , A (grande) não, A (imenso), daqueles com quem podemos sempre contar, daqueles que se esquecem de si próprios para ajudarem os outros, daqueles para quem se nós, mesmo que involuntariamente, tivermos uma atitude menos correcta, fingem nem sequer dar por isso, daqueles que mesmo que estejamos algum tempo sem mantermos contacto, nos lembramos sempre com um sorriso na alma, daqueles que cada vez mais é difícil encontrar nesta selva que é a nossa vida.

Este meu Amigo pertence ao grupo daqueles que dizem não ligarem ao dia em que nasceram, pensando bem ele até tem uma certa razão, porque no dia a seguir poderíamos festejar um ano e um dia de nascimento, e no dia a seguir um ano e dois dias e assim sucessivamente, e assim como o Natal é quando um homem (ou uma mulher) quiser, também o dia de aniversário de alguém poderia ser assim. Mas não é, e como não é, apeteceu-me dar hoje uns miminhos extras a esse meu Amigo, é que afinal o que tem piada no dia em que fazemos anos, é que todos aqueles de quem gostamos se lembrem de nós, e pensando bem não nos faz mal nenhum sentirmos-nos “especiais” por um dia.

E como esse meu Amigo merece mais do que ninguém sentir-se no “centro das atenções” nem que seja por um dia, quer ele goste, quer ele diga não gostar, resolvi escrever-lhe estas linhas, tendo a certeza que todos os outros que têm o previlégio de o conhecer me vão perdoar a ousadia.

PARABÉNS ZÉ, bem hajas.

Isabel

19 janeiro 2007

Bela Surpresa!




Pois é... bela surpresa que eu tive, quando no Tubo d'escape do Charraz encontrei o link para o novo espaço do Dionisio Leitão.

Aconselho que o visitem. As suas imagens, e não só, tocam-nos sempre de uma forma extraordinária.




Grande fotógrafo, grande poeta!




05 janeiro 2007

O Milagre das Couves



Ou: a gente ter canseiras com os outros, não compensa.


A estória que vou contar passou-se há muito tempo, numa terra longínqua, dos mapas ignorada, perdida entre montes, nas faldas do fim-do-mundo.

Era uma terra triste. Como triste era a gente que nela vivia, amargurada pela miséria e pela fome. Oprimida pelo peso herdado de uma vassalagem militante cobrada até à exaustão por quem detinha o poder. Gente que nascia com um pé no berço e outro na cova.

Ora, como em tudo na vida, e nas moedas, existem duas faces, e nem todos viviam com a barriga colada ás costas, curvados pela fome que rapavam. Num altaneiro castelo, entre sedas e brocados, governava um rico e anafado lavrador que dominava com mão de ferro os pobres camponeses. Chamavam-lhe o “Diniz dos Tomates”.Graça que lhe advinha pelo obsessivo desvelo com que cuidava, pelas próprias mãos, de um pé de tomateiras, qual árvore genealógica, legado tesouro de seus ancestrais avós.

Era com um incontrolável carinho que tratava, todas as manhãs, dos seus tomates, e até a castelã D.Belita, sua esposa, não tinha autorização para lhes poder tocar.
Grandes, gordos e luzidios aos primeiros raios da alvorada… era com a felicidade estampada no rosto que os admirava, ainda abotoando as bragas, após a estrumação diária. Uma erva daninha aqui, uma folha menos viçosa ali, tudo era minuciosamente aparado, beliscado, afagado tal qual corpo de moça temporã.

Estes tomates não acabavam os seus dias numa qualquer salada, como seria normal em tomates tão vistosos, não. Morriam de velhice, engelhavam até secar. As sementes cuidadosamente guardadas até voltarem, na próxima época ao fértil canteiro do lavrador.

Naquele ano as privações tinham sido particularmente agravadas. A seca aliada a uma renitente praga de gafanhotos tinham devastado as culturas tornando o já pouco sustento do povo numa miséria sem fim. Grandes fomes e doenças adivinhavam-se no horizonte. E a encapuçada figura da morte de foice em riste rondava o povoado, pronta para a colheita das almas.

Um dia, uma mulher foi bater à porta do castelo pedindo para falar com D.Belita. A mulher do lavrador tinha um coração de ouro, amargurado pelas privações sofridas pelo povo, fruto da escravidão feudal imposta por seu marido, e sempre arranjava maneira de auxiliar os pobres.

D.Belita recebeu a mulher que mais parecia um farrapo andrajoso e sem chama de vida. Tinha acabado de dar à luz três gémeos, que por infortúnio ou castigo de deus, tinham nascido com vida. Sem leite para os amamentar e sem coragem de os esganar, a mulher pedia a esmola e compaixão da castelã. Uns quantos legumes frescos que lhe fizessem brotar o leite adiariam por mais algum tempo o triste fim da sua prole.

A fidalga compadeceu-se da pobre, e sabendo que D.Diniz partira para caçar dirigiu-se à horta a fim de apanhar meia dúzia dos excelsos tomates de seu marido, únicos legumes poupados à canícula instalada.

Acto consumado, e saindo da horta com o regaço cheio, dá D.Belita de caras com o caçador que voltara mais cedo das lides venatórias. Os bichos rareavam, também por culpa da crise.
D.Diniz desconfiado com as andanças da mulher, e olhando-lhe por cima do ombro, adivinhando um assalto ao seu tesouro, pergunta-lhe, já com a voz desfigurada pela ira:
- Que trazeis debaixo do avental, mulher?! E não me digais que são rosas, porque nessa, eu não caio!
D Belita, com a serenidade de quem toda a vida fez o milagre de aturar tal cromo, respondeu-lhe, ao mesmo tempo que desdobrava o avental:
- São nabiças meu Senhor, pró caldo do almoço…
- Nabiças? Só se forem de sequeiro! Respondeu o Lavrador.
E uma atrás de outra, verdes nabiças cobriram os seus pés, levantando uma pequena nuvem de pó na terra queimada pelo sol.

Dizem, despudoradas língua viperinas, que depois do acontecido Diniz dos Tomates perdeu a razão. Matou a mulher cozinhando-a no caldeiro junta com as nabiças e serviu o macabro repasto aos seus mastins.

O castelo virou ruína em pouco tempo. O povo teve a sorte que tem qualquer povo.

Do lavrador não se sabe o seu fim. Houve quem o visse durante algum tempo vagueando pelas serranias, nu, segurando as suas partes podendas entre as mãos, uivando numa língua desconhecida onde só se percebia: - Estes são meus, ninguém mos tira!!!


PS: Aprendam a lição e preparem-se para os tempos difíceis que se avizinham...